quarta-feira, 15 de maio de 2024

 

Objetos

            Lá vem o dia cheirando a carros. Poderia exalar o cheirar de uma rosa ou o da brisa do mar, e não o do azul do carro. Poderia brilhar o dia, não o brilho de faroletes, e sim, o brilho exuberante de uma belo manhã de sol. A fumaça nos impede disso. Lá vem o dia esbanjando objetos.

sábado, 11 de maio de 2024

 

Só ando com o necessário

            Eu não tenho nada. Não acumulei nada. Só ando com o necessário. Em vez de ter várias casas, contento-me com asas. Não quero ser grande, andar como se de salto-alto. Eu não acumulei riqueza. Sou rico de companhia. Não morro de amor por carros. Gosto de observar o caminho. Não quero poder. Quero poder ser.

            Mas eu tenho um cachorro.

quarta-feira, 8 de maio de 2024

 

A roseira

            A roseira cobre-se sob um corpo de espinhos. Inventou este artifício para se proteger de herbívoros. O homem, carnívoro, deveria deixa-la em paz, mas inventou a tesoura para roubar-lhes as rosas e enfeitar as suas casas, usando algumas pétalas como marcadores de livros.

sábado, 4 de maio de 2024

 

O grande orgasmo

             Na verdade a vida aqui na terra deveria ter um final diferente do que acontece na maioria das vezes.  É sempre triste uma pessoa entubada esperando a morte num leito de hospital.

            Ao contrário do usual, nós deveríamos nascer e ter uma relação íntima conosco. Uma relação sexual. 

            Começaríamos nos descobrindo e usando de todas as possibilidades que a vida nos oferecesse para sentir prazer, e no fim, depois de muitos anos, já velhinhos, atingirmos o clímax, o ponto mais alto da nossa relação conosco: o grande orgasmo.

            E fim.