Devaneio
Ele ficou olhando para a tela do computador por alguns
minutos, e sem o que dizer, escreveu sobre um cachorro manco que não conseguia
urinar no poste e foi inchando, inchando, até estourar de tanta urina. Depois
escreveu sobre a calça no varal, balançando de um lado para o outro, e o
gatinho branco tentando alcançá-la, até conseguir e ficar com a pata presa,
desesperado, tentando se desvencilhar, e o vento batendo, e o gato lá embaixo,
tentando, tentando. Escreveu sobre a mulher que todos os dias passava pelos
seus pensamentos, com aquela saia engomada e aquela blusa cor de vinho manchada
de azul.
Sobre o baloeiro escreveu também, sentado na praça, sem ao
menos saber que estava ali, pernas cruzadas, uma das mãos apoiada no banco de
mármore, segurando os balões, e a outra cofiando a barba grisalha. Escreveu
sobre os barulhos da praça, da pipoca estourando no carrinho, lá na esquina, e
o cheiro chegando cá perto do banco do baloeiro, Escreveu também sobre os meninos
saindo da escola, jogando as mochilas para cima, chutando uns aos outros, as
beatas enroladas nos seus véus pretos indo para a missa que só começaria ao
anoitecer.
Escreveu sobre os pombos cometendo o pecado mortal de cagar na igreja, sem contar o pecado que não tem classificação no livro das coisa ruins do céu que é o da prática do ato sexual no caibro da entrada principal da igreja, mas logo foi se desinteressando por aquilo tudo e desligou o computador sem salvar o texto.
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